quinta-feira, 11 de junho de 2015

Era uma casa muito engraçada: mudança de paradigma

                                                      Não tinha teto... Não tinha nada...


Mudar de paradigma, transpor barreiras, ser mais coerente e verdadeiro consigo mesmo.
Questões atualíssimas para todos nós, que em algum nível nos sentimos insatisfeitos com alguns caminhos destrutivos, violentos e adoecedores que, coletivamente, temos escolhido como padrão.
Mas mudar é sempre um risco, e frente ao risco a tendência inicial é de paralisia ou de fuga... então não mudamos. Ficamos na mesma situação, rosnando, criticando, endurecendo os nervos e o coração e nos justificando que é assim que tem que ser. Não ficamos felizes mas não mudamos. Não mudamos por medo. Porque mudar é assumir os riscos e as consequencias... Os famosos "e se" tomam conta.
E se não der certo?
E se não for como eu imagino?
E se eu arrepender?
E se o bicho papão (aqui pode ser substituído por qualquer autoridade, tipo Conselho Tutelar, Polícia, Diretor do Hospital, Vestibular, Mãe, etc....) me pegar? Me prender? Me questionar???
E se todo mundo me criticar?

Há duas semanas reencontrei com a Ana Thomaz (uma pessoa admirável) que coordenou uma vivência para famílias aqui em Uberlândia. E novamente foi uma gostosura inquietante escutá-la. Porque  ela aborda um assunto super delicado: Nós temos a capacidade de produzir a nossa realidade. Aquilo que somos, vivemos, enxergamos e sentimos está diretamente relacionado com nós mesmos. Mais que nos afetar, diz respeito diretamente a nós, está dentro de nós e é produzido por nós!!! Quando nós mudamos, a realidade muda!

E eis que é assim mesmo que me aconteceu. Quando eu mudei, a realidade mudou e os medos se dissiparam. Quando há mudança de paradigma, tudo que angustia e aflinge no modelo anterior, perde o sentido. Não tem como comparar, não tem como por numa mesma balança... Os medos de um, não atingem o outro.

Eu sentia que o modelo tradicional de ensino não mais comportava os meus desejos, sonhos e crenças sobre educação. Eu questionava muitos padrões e formatações pelas quais as escolas submetiam as crianças. E um belo dia eu descobri que a escola e o modelo de educação tradicional não eram os únicos existentes e possíveis. Eu abri meus olhos e descobri um novo universo. E num primeiro momento senti medo. E agora, que eu sei de tudo isso? E os meus filhos? E tudo que esse modelo tradicional promete, acomoda, segura? Mas a descoberta foi tão forte que superou o medo. Me permiti arriscar, embarquei (com a sorte de ter um companheiro no mesmo barco) e tranpus as barreiras. Criamos um espaço mais condizente com o que acreditamos ser educação, com o que acreditamos ser a potência de aprendizagem, que é o respeito e a autonomia de cada ser humano e a crença de que somos naturalmente seres interessados e capazes de aprender e de nos relacionar. 

Faz um ano que criamos esse espaço: a Casa da Árvore e o que eu tenho a comemorar é a dissipação
dos meus medos antigos.... não os tenho mais. É bem normal do lado de cá. Meus filhos continuam os mesmos, continuam me surpreendendo, crescendo, se desenvolvendo, aprendendo.... a diferença é que não tenho mais que ficar ranzinza, questionando ou sofrendo com o que está externo a mim, com o sistema que me aprisiona (no caso esse sistema, porque sou humana e continuo presa a outros medos), eu assumi o controle sobre a minha realidade e atuei nela, de forma potente e criativa. E se a gente fica bem, os filhos também ficam. Simples assim... Felizes, potentes e criativos.

Tudo isso é porque hoje assisti a uma reportagem do nosso espaço, realizada pela equipe do Programa de Bairro em Bairro de nossa cidade. É bom ver a árvore florindo, se fortificando, em sua natureza de ser o que é... Um belo presente de aniversário de um ano. Parabéns Casa da Árvore! Gratidão a todos os que andam a sonhar e realizar juntos, ás crianças, adolescentes, pais, mães e equipe de profissionais que cotidianamente transformam sua realidade. Bora lá que é só o começo!



P.S: Tudo o que expus e disse diz respeito a mim e a minha realidade. Não julgo, não critico nenhum modelo ou escolha educacional de nenhuma outra família e nem condeno nenhum modelo escolar. Adoro a diversidade e luto apenas pelo direito de escolha. Afinal, cada um é que sabe a dor e a delícia de ser o que é, não é mesmo??? 


segunda-feira, 1 de junho de 2015

Encontros


Os Encontros Nacionais, Regionais e Municipais de Adolescentes, dos quais participei de 1995 a 2002, além das Prévias, das reuniões de organização dos Encontros e afins, tiveram uma importância em minha vida que eu ainda não sei precisar muito bem. Olhando em retrospecto, tento lembrar o impacto de estar num espaço com mais de 300 adolescentes pela primeira vez, ou das Oficinas e Grupos de Trabalho que ministrei, das reuniões com educadores, do "Parabéns pra você" que um auditório inteiro cantou pra mim, das conversas com índios, do contato com tanta gente de lugares diferentes do país. Provavelmente, se escrevesse aqui a quantidade de coisa que quis falar nas mais diversas situações durante os encontros, mas não falei, acho que não terminaria este texto tão cedo. (Aparentemente, eu "era" meio tímido e inseguro). Vou tentar descrever o que acredito que toda essa experiência me trouxe de crescimento e de confirmação de valores que hoje se concretizam na minha relação com a educação.

Os Encontros, como disse acima, representaram o primeiro momento em que me vi com dezenas de adolescentes no mesmo lugar. Para aqueles que estudaram em escolas convencionais, isso era uma experiência cotidiana. A minha escola era pequena, era diferente de todas as escolas que eu conhecia - pra mim, aquilo tudo era novidade. Todas as palestras, Oficinas, Grupos de Trabalho e afins dos quais participei não me marcaram tanto quanto as conversas, as rodas de violão, as brincadeiras nos ônibus e nos momentos sem programação. Na verdade, o que mais me marcou naquelas outras atividades foi justamente o contato com muitas pessoas diferentes. Sentia estranheza quando algumas delas demonstravam estar maravilhadas com as Oficinas, com a participação dos adolescentes nas mesas-redondas e palestras. Aquilo era meio normal pra mim, pois diversas práticas que aconteciam nos Encontros eram comuns em minha escola: Oficinas, atividades coordenadas por adolescentes, atenção aos nossos desejos etc. 

Mas os Encontros também trabalhavam com uma coisa que não era comum em nenhuma escola tradicional: a visão do adolescente como um ser humano integral, dotado de inteligência, sensibilidade, emoções. Toda mudança que os Encontros pretendiam provocar nas pessoas eram mudanças que passavam pela afetividade, mais do que pela racionalidade, pela informação, pelo conteúdo. Os Encontros reconheciam a limitação dessa esfera e investiam nisto que todos nós adolescentes (à época) trazíamos à flor da pele: emoção. Havia palestras, mas havia massagem, toque. Havia Grupos de Trabalho, mas havia também danças circulares. Essas são um capítulo à parte. Normalmente, os momentos em que todos os participantes do Encontro se encontravam realizando a mesma atividade eram os momentos das danças. Elas abriam os Encontros, davam boas-vindas ao dia que começava, e encerravam os eventos. Nem todos dançavam, mas quem o fazia sentia uma conexão sagrada difícil de explicar. Mesmo quem não tem religião (ou nos casos da dança não ter nada a ver com a religião que praticava) não poderia negar que as danças nos colocavam em contato com algo maior que cada um individualmente. Pra mim, nos conectávamos ao grupo, presentes no momento e movimento da dança. Uma das minhas coisas favoritas.

Nem tudo era uma maravilha, claro. Eu ficava bastante irritado com as pessoas que afirmavam "não fazer ideia" do que faziam ali. Com a meia dúzia que fazia uma farra um pouco exagerada (e sem cuidado com os lugares e espaços ocupados). E, principalmente, com aqueles que se esforçavam para chamar a atenção. Aquilo me irritava um bocado. Problema meu, claro, não deles. Como eu não sabia lidar com a atenção, tentava ficar quieto no meu canto. Só participava quando achava que tinha certeza que iria contribuir com alguma coisa. Isso foi mudando aos poucos e nos últimos Encontros eu já estava mais relaxado. Mas demorou um pouco. Acredito que tenha havido gente que me conheceu sem nunca ter ouvido a minha voz :) Educador juvenil, fiquei beeem mais solto, mas daí já tinha passado da hora, e dei uma maneirada antes que ficasse meio ridículo. Mas mesmo caladão consegui fazer amigos, até namorar (!). Fiquei, inclusive, com uma pessoa que era (ainda é) um tanto diferente de mim: sorridente, simpática, falante, comunicativa (a lista de qualidades pode se estender muito mais...). Pois é, nos conhecemos em 95, nos tornamos amigos em 98, ficamos e começamos a namorar em 2000. E estamos juntos até hoje :) Essa história merece um post só pra ela. Depois.

Minha participação nos Encontros era sustentada por um trabalho voluntário na escola que se estendeu um pouco depois de eu ter completado o Ensino Médio. Bem antes de me tornar professor, tive a oportunidade de trabalhar em diferentes salas de aulas, com pessoas de diversas idades. Sou voluntário atualmente e respeito muito essa relação com o trabalho.

Sou grato a todos os educadores responsáveis pelos Encontros dos quais participei e pelos grupos dos quais fiz parte, aos amigos com quem dividi momentos alegres, aos desafetos que me ensinaram uma pá de coisa, às experiências que tive, às reflexões que todas as situações me provocaram... Sei que, se não fosse por isso tudo, eu seria uma pessoa diferente hoje. Trabalho com crianças e adolescentes e sei que o meu jeito "de igual para igual" de lidar com eles se deve aos Encontros. Meu interesse (ou melhor, paixão) pela educação deve muito a essa história toda aí. Pronto, já falei demais. Se eu pensar em mais coisa pra compartilhar, eu conto. Um dia.

Luís Gustavo