quarta-feira, 27 de setembro de 2017

A partida da Otsu

E ela partiu. Na hora do almoço. 
Esperou a família toda chegar em casa para enfim descansar. 
Nossa cãopanheira de 13 anos. Uma Akita dócil, silenciosa, e super paciente com crianças. 
Estava velhinha e há cerca de dois meses começou a dar sinais de "velhice". Menos interesse em brincar, menos apetite, uivos de dor e dificuldade para andar... optamos por não intervir cirurgicamente (tinha opção por identificação de um tumor) por saber que os sinais faziam parte da idade e o procedimento não aliviaria sua dor.
E ela se manteve estável até ontem, comendo e interagindo quando a gente lhe dava atenção. 
Hoje amanheceu com gemidos de desconforto, passou a manhã mostrando mais cansaço e quando finalmente o Gu chegou para almoçar e fez um cafuné, ela se permitiu descansar. 
A gente vai sentir sua falta Otsu... do seu rabinho balançante, das viagens nas espaço-naves do Yuri e da Luana, nos passeios pelo bairro, nos banhos demorados por causa das suas 3 camadas grossas de pêlo, da sua mania de dormir na parede encostada no quarto dos meninos, dos seus pulos e adestramentos, do seu olhar doce e sempre vigilante. 
Gratidão pelo tempo e carinho compartilhados.



















quinta-feira, 21 de setembro de 2017

Cansei de ser Santa

E a espiral que insiste em girar me trouxe para perto do ponto inicial novamente
Um ano se passou desde o Vendaval que me desorganizou e me levou para outro lugar em mim mesma, estranhamente familiar
Abri janelas e portas há tempos confortavelmente fechadas
Sai do ninho

Me permiti viajar sozinha
Sair com amigos, rir, beber
Trocar confidências
Flertar, me sentir desejada                                      
Emagreci e ousei me expor
Expus meu corpo
Ao dançar, me revelei

Finalmente conheci a Umbanda
e fui tomada pelo Sagrado
pela magia e espiritual
Senti na pele e no coração a força de meus Guias
Minha imperfeição foi acolhida
Reconheci meu lugar

Ah!
E fui me abrindo, me sentindo, me experimentando
Reconfigurando minha sexualidade
Atravessando tabus, medos, vergonhas
Sentindo dores profundas... dores de morte e vida
Profundos dilemas
De luta por mim mesma
Sintomas e mais sintomas no útero, na vagina, na alma
Ao mesmo tempo
Uma força descomunal, um poder imenso em mim mesma
Libertação e desejos a flor da pele
Dona de mim, do meu corpo, do meu prazer


Há um ano, me deparei frente a frente com minhas sombras
e foi um mergulho profundo nas minhas próprias entranhas
Sombras, lama, escuros
Eu, menina, com medo de pisar no fundo do rio
Fui arremessada para o meio do mangue 
Onde apesar do desconhecido, descobri Vida

E eis que me encontro novamente me descamando, me despindo, me expondo, me revelando
como uma serpente, em troca de pele

E ainda com medos e mais medos
Medos da menina que precisa corresponder a todas as expectativas
Que se mescla ao ambiente para se ocultar ou para ser vista em conformidade
Ela ainda me  habita
E a cada nova descamação, mais profundamente eu me enxergo

Não sou Santa
E não preciso ser
Santa não peca, não erra, não sente medo
Santa não deseja, não fala palavrão, não bebe
Não sou Santa
Sou Humana
Sou Terra e Sou Fogo
Sou Mãe, Sou Esposa e Sou Mulher
Sou Família e Sou Só
Sou tantas
Não sou Santa
Mas ainda assim Sou Sagrada
Sagrada em ser assim

Com essa mesma LAMA que limpa, purifica, cura
Essa lama que regenera, que transforma e transmuta
Entre a Terra e a Água
Lama que nutre, que abastece, que sustenta

Com essa SERPENTE, eu me livro do que já não serve mais        
Eu deixo minha casca seca, me desgrudo do que já não sou
Já tenho uma pele nova
Mais viva, mais brilhante, mais potente
Eu mesma me recrio
E com meu veneno, me resgardo
E com meu veneno, com a dose certa, curo


A idade, a lama, a serpente, a umbanda, a dança me trouxeram aqui
E sou grata a tudo que vivi e a tudo que ainda vou viver

Sou grata ainda e acima de tudo ao AMOR
que me acompanha em forma de um homem
Um companheiro de recriação
Que me permite transmutar enquanto me oferece seu porto seguro
Eu escolho, todo dia, estar ao seu lado

Não sou Santa, e não preciso ser
Mas ainda assim, sou Sagrada