quinta-feira, 29 de setembro de 2016

Forças contrárias a mudanças reais na educação

Forças contrárias a mudanças reais na educação 
Porque a reforma educacional deve ocorrer fora do sistema de ensino
 


Peter Gray
Professor Pesquisador do Departamento de Psicologia da Universidade de Boston
Autor do livro
Free to Learn, disponível para compra aqui.
 

Tradução de Luís Gustavo Guadalupe Silveira

Em postagens anteriores, eu apresentei evidências que corroboram as seguintes afirmações: (1) Os instintos infantis de brincar e explorar por conta própria forneceram a base para a educação durante nossa longa história como caçadores-coletores.
[1] (2) As crianças hoje podem educar a si mesmas, e realmente o fazem, muito bem, sem coerção, direcionamento ou estímulo de adultos, caso lhes seja oferecido um ambiente que apoie seus instintos de brincar e explorar.[2] (3) As escolas convencionais são o que são hoje por causa de circunstâncias históricas que levaram as pessoas a desvalorizar a brincadeira, a acreditar que a força de vontade das crianças deve ser dobrada, e a acreditar que tudo que é útil, inclusive a aprendizagem, requer trabalho duro.[3]

Hoje, muitas pessoas compreendem o valor educacional da brincadeira e da exploração livres, lamentam que as crianças tenham relativamente pouca oportunidade para realizar tais atividades, e acreditam que a força de vontade das crianças contribui positivamente para seu desenvolvimento, sua educação e sua satisfação com a vida. Todavia, as escolas continuam a ser como antes. Realmente, a escolarização convencional e outras atividades direcionadas por adultos que seguem esse padrão de escolarização ocupam uma parcela cada vez maior do tempo das crianças. Por que é tão difícil assim reverter essa tendência? Por que é tão difícil assim realizar mudanças fundamentais dentro do sistema de ensino? Eu não sei qual é a resposta final a essas perguntas, mas apresento aqui um esboço de meus pensamentos a respeito das forças que dificultam tanto a realização das mudanças fundamentais no sistema de ensino.

A Normalidade da Escolarização Convencional

Como os psicólogos sociais frequentemente apontam, as pessoas fazem de tudo para parecerem normais. Se nos comportarmos diferente da norma, os outros podem nos rejeitar e não há nada pior para nós, seres sociais, do que a rejeição. Se em determinada cultura, todas as pessoas enfaixam os pés das meninas, apertando-os, então mesmo os pais que não acreditam nessa prática fazem o mesmo, para que suas filhas não pareçam estranhas. Se todas as crianças da vizinhança vão a uma escola convencional, então a criança que faz algo completamente diferente disso pode ser vista como estranha, e os pais podem ser vistos não só como estranhos, mas como negligentes.


Para ter uma pequena amostra de quanto nós identificamos as crianças com sua escolarização convencional, ouçam a qualquer conversa (ou tentativa de conversa) entre um adulto e uma criança que o adulto tenha acabado de conhecer: “Em qual série você está na escola?” “Qual é a sua matéria preferida?” “Você gosta da sua professora?” “Você está ansioso pelo começo das aulas?” Temos que descobrir um jeito completamente novo de conversar com crianças que não vão a escolas assim.
 

As escolas novas que se baseiam em princípios muito diferentes daqueles de escolas convencionais atraem relativamente poucos estudantes, mesmo entre aqueles que acreditam nos princípios, por causa do medo de fazer algo que pareça anormal. Crianças que decidem frequentar essas novas escolas precisam de muito apoio para combater esse medo, e seus pais precisam ainda mais de suporte.

As Profecias Autorrealizadoras da Escolarização Convencional 

A escolarização convencional promoveu maneiras de pensar e de agir que transformam suas próprias premissas em profecias autorrealizadoras. As premissas parecem ser verdadeiras porque as avaliamos dentro do contexto da escolarização convencional e pelos critérios estabelecidos por essa escolarização.
 

Aqui vai um exemplo dessas premissas: As escolas precisam motivar as crianças a aprender. Eu encontrei, inúmeras vezes, pais que acreditam que escolas nãoconvencionais tais como a Sudbury Valley são ótimas para “crianças automotivadas” mas não para os seus filhos, pois eles “não são automotivados”. E as próprias crianças frequentemente acreditam nisso. Elas dizem coisas como “Eu preciso de um professor que fique em cima, ou eu não vou fazer nada o dia todo”. Por que as pessoas em nossa cultura têm essa visão de que as crianças em idade escolar não irão aprender muita coisa se deixadas por conta própria? Quase ninguém pensa isso a respeito de crianças que ainda não estão em idade escolar,[4] e os caçadores-coletores não acham isso de nenhuma criança.[5] 

Uma das razões para se pensar que crianças em idade escolar não são motivadas para aprender por conta própria vem da aceitação geral em nossa cultura da definição de aprendizagem dada pelo sistema de ensino. Ao definir aprendizagem como a realização de exercícios ou tarefas que se parecem muito com exercícios escolares, então certamente é verdade que crianças “desescolarizadas” ou que frequentam escolas Sudbury passam pouco tempo “aprendendo”. Em vez disso, elas passam seu tempo brincando e explorando, de forma imprevisível, e adquirem conhecimentos e habilidades de sua cultura como efeito colateral.

Outra razão para essa percepção é que crianças que passam seu dia em escolas convencionais, fazendo provas ou tarefas que não querem fazer, podem, ao final do dia, passar seu tempo livre relaxando, descansando, extravasando, do mesmo jeito que seus pais fazem depois de um dia estressante no trabalho. Isso diminui as chances de as crianças se engajarem completamente naquele tipo de brincadeira, exploração e conversação que nós identificamos mais facilmente como atividades educativas.
 

Outro exemplo de profecia autorrealizadora na escola é este: O bom desempenho escolar é um indicador de sucesso futuro. Fazemos essa profecia se tornar realidade ao criar um mundo para as crianças em que definimos “sucesso” como bom desempenho escolar. O trabalho das crianças é tirar boas notas na escola, e há muitas recompensas para quem faz isso. Boas notas são o critério para avançar ao próximo nível no sistema escolar seriado, para o lugar que se ocupa na “lista dos melhores alunos”, para se tornar elegível para jogar em um time, para entrar na universidade, para nomeações em sociedades concorridas, para receber aprovação dos adultos etc. Assim, claro, de acordo com todas essas medidas de sucesso, o bom desempenho escolar (como o que é medido pelas notas) prevê o sucesso futuro. Além disso, nós somos bombardeados todos os dias com estatísticas que mostram a correlação entre anos de escolaridade e o sucesso na carreira que pode ser medido pela renda. Entretanto, há muitas razões para a existência dessas correlações que nada têm a ver com aprendizagem. Aqui estão três dessas razões:

(1) Criamos um mundo no qual certos empregos bem pagos, tais como advocacia, medicina e administração de empresas, normalmente requerem alguns anos de educação superior. Nesse mundo, anos de escola inevitavelmente correspondem à renda.
(2) Criamos um mundo no qual o “sucesso” é mais ou menos definido como tirar boas notas na juventude e ganhar muito dinheiro mais tarde. Nesse mundo, as pessoas que são altamente motivadas por conquistas, nos termos convencionais, irão trabalhar por notas altas na escola e por dinheiro na vida adulta; e,
voilà, eis a correlação. Nós também criamos um mundo em que pouquíssimas pessoas não frequentam escolas convencionais, assim pais e crianças têm acesso a poucos exemplos de outras trajetórias de sucesso.
(3) Crianças de lares ricos podem arcar com mais despesas educacionais do que aquelas de lares mais pobres, assim obtêm mais educação escolar. As crianças de lares ricos também têm mais oportunidades de conseguir empregos mais bem pagos, em função de contatos familiares e muitas outras vantagens, do que crianças de lares pobres. Isso também ajuda a criar a correlação entre anos de escolaridade e renda futura.


Por essas e outras razões, é inevitável encontrar correlações entre escolaridade e “sucesso” no mundo que construímos. Não é possível determinar estatisticamente se uma dessas correlações tem alguma coisa a ver com o que se aprende na escola. 


O Entrincheiramento da Indústria Educacional 

Outro motivo da inércia que impede mudanças reais em nosso sistema educacional tem a ver com a natureza massiva e entrincheirada do negócio educacional. Nos Estados Unidos, 6,8 milhões de pessoas atualmente ganham a vida como professores, de acordo com o Departamento Norte-Americano de Recenseamento. Contrariando a opinião geral, o magistério paga melhor que a média dos empregos administrativos ou de escritório[6] e oferece muitos outros benefícios, incluindo geralmente estabilidade, excelentes planos de aposentadoria e longas férias. Escolas de magistério, que preparam professores para escolas convencionais, abrangem uma grande parte das instituições de educação superior. A indústria dos livros didáticos também é grande e lucrativa. Uma mudança radical em nosso sistema educacional iria perturbar tudo isso. Tal mudança iria abolir nossa necessidade por professores, como os definimos hoje. Iria abolir também nossa necessidade por escolas de magistério e por livros didáticos, senão completamente, ao menos em grande medida.

Muitas pessoas em nossa cultura possuem interesse econômico não somente em preservar, mas também em expandir a educação convencional. Quanto mais horas e anos de escola exigimos dos jovens, mais professores, administradores escolares, professores de licenciatura, autores e editores de livros didáticos nós empregaremos. O negócio da educação é igual a qualquer outro: está constantemente em busca de expansão em prol daqueles que lucram com ele.


A indústria educacional prospera com pequenas mudanças e novidades. Novas ideias sobre como motivar as crianças, novos cursos e novas formas de ensinar velhos cursos (tais como “a nova, nova, nova matemática”) fornecem empregos para professores de licenciatura e editores de livros didáticos. Mas as mudanças fundamentais do tipo que eu venho apresentando em postagens anteriores neste blog iriam perturbar isso tudo. 

Mudanças Graduais Não Funcionam

Outra barreira para o tipo de mudança na escola sobre a qual tenho falado é que ela não pode ser feita gradualmente dentro da escola ou do sistema educacional. A mudança requer uma troca de paradigma, de um no qual professores estão no comando do processo educacional para outro no qual cada estudante está verdadeiramente no controle de sua própria educação. Não dá para fazer isso um pouquinho de cada vez.

Enquanto professores estabelecerem um currículo, não importa quantas escolhas ofereçam dentro desse currículo, os estudantes verão como tarefa do professor, e não de si mesmos, decidir o que aprender. Enquanto professores avaliarem o desenvolvimento dos estudantes, não importa como seja feita essa avaliação, os estudantes considerarão
que sua tarefa é corresponder às expectativas dos professores, não estabelecer e alcançar suas próprias expectativas.


Na realidade, o acréscimo de escolhas e de meios menos claros de avaliação dentro do sistema convencional de educação pode fazer com que as vidas dos estudantes fiquem ainda mais estressantes do que antes. Depois de tais mudanças “liberais”, fica a cargo de cada estudante adivinhar o que é que o professor quer que ele faça e adivinhar o verdadeiro, e não dito, critério de avaliação. A escola se transforma em um exercício de leitura da mente. Minha visão é que dentro do sistema convencional de educação a melhor forma de ensinar é sendo o mais claro possível a respeito das exigências e critérios, assim os estudantes podem corresponder a isso com o mínimo de receio de que estejam estudando as coisas erradas.
 

Você também não pode, dentro do sistema convencional de educação, esperar eliminar a avaliação gradualmente, uma matéria de cada vez. Suponhamos que você introduza dentro do currículo uma matéria em que os estudantes não recebam notas. Você verá que a maioria dos estudantes não irá fazer nada nessa disciplina, mesmo se quisesse. Num sistema em que as outras matérias valem nota, a que não vale é vista como irrelevante. Como um bom estudante pode justificar se dedicar a uma matéria que não vale nota se outras valem? Para mudar essa mentalidade, todo o sistema precisa mudar. 

Como a Mudança está Acontecendo

Todavia, a mudança fundamental na escola está ocorrendo fora do sistema escolar tradicional. Está acontecendo entre grupos de famílias que decidem “desescolarizar” suas crianças (ou seja, ensinando-as em casa de uma maneira livre, sem currículo ou avaliação) e entre pessoas que abrem escolas não-escolares, tais como as que seguem o exemplo da Sudbury Valley School. As pessoas nesses movimentos estabelecem entre si novos conjuntos de normas sociais, que as permitem superar as barreiras que se erguem diante das maneiras que soam anormais para outras pessoas. Ao testemunharem as crianças que estão se educando a si mesmas, essas pessoas passam a ver a educação sob uma nova luz, como algo para admirar e desfrutar nas crianças, mas não para controlar. Começam a ver muitos exemplos de pessoas que se educaram de maneira livre e feliz, fora do sistema escolar convencional, e seguiram em vidas bem-sucedidas, de acordo com todas as definições significativas de sucesso, e assim as profecias autorrealizadoras da escolarização convencional são finalmente compreendidas.

Não temos motivos para nos sentirmos desanimados com o futuro da educação. Só precisamos perceber que a verdadeira reforma não irá acontecer dentro do sistema escolar estabelecido. Ela continuará acontecendo fora desse sistema. A mudança gradual que irá acontecer é que cada vez mais gente irá deixar as escolas convencionais. Para permitir que isso aconteça, temos que garantir que as pessoas tenham o direito legal de escolher não fazer parte desse sistema. Em um nível político, isso deveria ser a maior
prioridade daqueles que buscam um mundo no qual crianças possam se desenvolver de maneira livre e feliz, experimentando completamente a democracia, com os direitos e as
responsabilidades que ela traz.


NOTAS DO TRADUTOR

1 - “Children Educate Themselves III: The Wisdom of Hunter-Gatherers”, disponível em:https://www.psychologytoday.com/blog/freedom-learn/200808/children-educate-themselves-iii-thewisdom-hunter-gatherers.
2 - “Children Educate Themselves IV: Lessons from Sudbury Valley”, disponível em:
https://www.psychologytoday.com/blog/freedom-learn/200808/children-educate-themselves-ivlessons-sudbury-valley.
3 - “A Brief History of Education”, disponível em:
https://www.psychologytoday.com/blog/freedomlearn/200808/brief-history-education

4 - “Children Educate Themselves II: We All Know That’s True for Little Kids”, disponível em: https://www.psychologytoday.com/blog/freedom-learn/200807/children-educate-themselves-ii-weall-know-s-true-little-kids.
5 - Ver nota 1.

6 - Para mais informações, acessar http://www.manhattan-institute.org/html/how-much-are-publicschool-teachers-paid-5831.html.

segunda-feira, 26 de setembro de 2016

Dentro de mim

Primavera explodindo aqui dentro de mim.

Essas mudanças de estação... da vida... do tempo...

Amadurecer tem me provocado sensações, sentimentos, emoções.
Tenho me encontrado comigo mesma frequentemente... encontros que me refletem menina, outros, adolescentes, outros, mulher... Alguns, tão comuns, me causam aconchego, reconhecimento, certezas... Outros, me provocam um turbilhão, um estranhamento, uma força que assusta.
Raizes e Asas.

Ando enamorada por mim mesma. Pela minha história. Pelo que ainda posso ser.

E meus filhos estão crescendo. E sinto isso no meu corpo, no meu coração, na minha alma. Vou voltando a olhar pro lado, a me interessar pelo mundo lá fora, a me reconhecer mulher. Outros planos, outros sonhos. A casa interna já não é suficiente. Eles se desgrudam, eu me desgrudo.


Primavera explodindo aqui dentro de mim.

Me reencontrar com uma outra potência. A profissional, a sonhadora, a desbravadora. Tantos projetos. Tantos encontros. Tantas possibilidades.

Eu, mulher. Donzela, Mãe, Feiticeira e Anciã. Predominando, a Feiticeira.

Eu, Senhora das Sombras. Acolhendo, reconhecendo e admirando as Sombras que habitam em mim.

Eu, Útero. Que sente, que enche, que esvazia, que grita, que chora e Sangra.

Eu, Tambor. Coração que pulsa, que toca, que dança, que dá ritmo.



Essas mudanças de estação... da vida... do tempo...

Passei novamente por um Portal. Dessa vez, em grupo. Um Círculo Sagrado de Mulheres.

Contato direto comigo mesma, no encontro com as Outras. Somos tantas! E somos Uma.

E a Vida, Movimento Constante, vem e me Muda. Novamente.

Nossos caminhos, escolhemos caminhando. Um labirinto sem centro, sem chegada, nem fim. Ondas que vem e que vão. O que existe é o momento e sou Eu, Agora. Curtir o caminho, mais que a chegada. Curtir e caminhar.

Gratidão ao Universo, a Gaia, A Hecate, a Oxum, ao Feminino.

Amor, eu sou.