quinta-feira, 31 de outubro de 2013

"Mas eu sou obrigado a aprender isso?"

Tenho lido muita coisa sobre educação atualmente (mais até do que eu sempre li, pois me interesso demais por esse assunto). Gostaria de compartilhar com vocês uma das últimas coisas que li e que trata de um assunto muito interessante: podemos ou devemos obrigar alguém a aprender algo? Não é um tema diretamente ligado à TV, embora esteja relacionado ao contexto geral, que tem a ver com as escolhas que fazemos do que fazer com nosso tempo, as escolhas das atividades e fontes de aprendizado para nós e nossos filhos etc. Posto aqui um artigo da educadora Cathrine Gobron, diretora da North Star, que acabei de traduzir. Se você quiser ler o original, clique aqui.

Galinhas e ruas: por que a instrução compulsória é desnecessária

Catherine Gobron – Diretora da North Star: Aprendizagem auto-dirigida para adolescentes


Eu trabalho num programa educacional para adolescentes no qual os estudantes têm total controle sobre seu próprio horário e não têm nenhuma exigência acadêmica. Somos muito questionados sobre como isso poderia funcionar. Uma pergunta frequente é: “Como as crianças vão aprender a fazer coisas de que elas não gostam se elas não são obrigadas a fazê-las?”
Você deveria pensar que a educação formal deveria buscar algo um pouco mais elevado do que ensinar as crianças a suportar as obrigações. Mas a pergunta surge o tempo todo.
Aqui está a minha resposta:
Tarefas desagradáveis são abundantes. A vida é absolutamente repleta de coisas que preferimos não fazer.  Lavar roupa, lavar louça, passear com o cachorro, aspirar o carro, aparar a grama, escrever bilhetes de agradecimento para a sua avó, trocar o óleo do carro, negociar com a companhia de seguros... Há uma lista infinita de coisas que fazemos apesar de não querermos fazer. De vez em quando, adiamos uma ou outra dessas necessidades, e sofremos as consequências, seja viver temporariamente com a louça suja ou ter o carro apreendido por não ter pagado as multas. Não precisamos praticar fazer coisas de que não gostamos, e não precisamos praticar sofrer as consequências. A vida está cheia das duas coisas. Elas dificilmente podem ser evitadas.
Além disso, em minha experiência não vejo nenhuma diferença entre aqueles que foram à escolar e aqueles que não foram no que diz respeito à habilidade de realizar atividades desagradáveis. Anos de lições monótonas e exercícios insípidos não parecem aumentar a probabilidade de alguém manter os dentes limpos regularmente, por exemplo. Anos de tarefas obrigatórias e rotineiras podem aumentar a resignação de uma pessoa a uma insossa vida profissional adulta, mas essa é uma meta digna para a educação?
Por que a galinha atravessou a rua? (Para chegar do outro lado, claro.) Por que fazemos qualquer coisa? Simplesmente para fazer, ou porque há algo do outro lado que pensamos valer a pena ter ou conhecer ou experimentar. Ninguém precisa fazer pessoas (ou galinhas) atravessarem a rua. Você pode ajudar alguém a alcançar sua meta olhando um mapa com ele ou ajudando-o a pensar em seus planos. Não há necessidade de fazê-lo atravessar nenhuma rua em especial, metaforicamente ou não. Na verdade, tentar fazer isso é uma boa maneira de evitar que uma pessoa deseje atravessar ou que obtenha algo na jornada.
Obrigar as pessoas a fazerem coisas que não gostam as encoraja a não gostar daquilo a que estão sendo obrigadas, ainda que essa coisa seja divertida ou valiosa. Se uma pessoa encontra uma rua que vale a pena atravessar, ela irá atravessar. Os ajudantes em sua vida podem ser úteis acreditando que ela pode fazer isso e que irá fazer, e dizendo isso a ela. Outras maneiras úteis de ajudar se tornarão evidentes por meio da interação e da discussão.
Como os jovens irão aprender a fazer coisas de que não gostam? Estabelecendo suas próprias metas e tendo confiança para trabalhar por elas. Não há necessidade de procurar ou criar desafios ou obstáculos desagradáveis. Eles vão encontrá-lo. A pessoa que é motivada por seus próprios desejos e ideais irá trabalhar em meio e ao redor dos obstáculos. A prática consiste em fazer.
Todos os dias em meu local de trabalho eu vejo adolescentes ignorarem jogos e diversão em seu caminho para a aula. Por que os adolescentes iriam para a aula quando eles podem brincar lá fora ou fazer outra coisa mais legal? Porque eles querem. Não há necessidade de obrigá-los. As crianças que não estão na aula estão fazendo outras coisas importantes, que poderiam ser qualquer coisa, desde fazer amigos até juntar coragem para encarar consequências.
Aprendizagem não-compulsória se beneficia de reflexão, abertura, apoio e discussão. Obrigar é desnecessário, e mesmo contraprodutivo, para o aprendizado.
Quando pensamos em nossa própria vida adulta, esses argumentos são óbvios. Nós fazemos coisas que somos motivados a fazer e nos sobressaímos nas coisas de que gostamos. Crianças também.

Um comentário:

  1. Vou ter que reler várias vezes,mas acho que esse é um bom assunto pra reflexão,que provoca mudanças.....

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