terça-feira, 2 de setembro de 2014

Outras formas de escolarizar - O modelo Sudbury

Publico aqui minha tradução do texto The Sudbury Model of Education, de Jeffery Colins, da Hudson Valley Sudbury School, com sua autorização (e agradeço Bruce Smith pelo contato com o autor). Ele apresenta um resumo dos princípios e práticas que caracterizam esse modelo de educação escolar. "Modelo" pode cheirar à receita pronta, mas acho que não é o caso. É um método, um jeito de fazer e, desde que tenha alguém fazendo algo, tem um método envolvido. Muitas vezes é algo implícito ("Ah, faço do meu jeito, não sei explicar..."), às vezes, explícito. Esse texto é justamente a tentativa de explicitar algo que, na prática, tem muito mais riqueza, detalhe, sutilezas e dificuldades. Acredito que um modelo possa servir de norte, de guia, de lembrete quando surgem dúvidas sobre qual caminho seguir. Não acho que deva ser um conjunto de dogmas inquestionáveis, superiores à prática e aos indivíduos que vivenciam as situações. Mas sua explicitação ajuda inclusive a refletir e questionar o próprio fazer, quando isso se faz necessário. Além disso, pode nos levar a repensar outras coisas, outros temas que aparecem aqui: escola, educação, relação adulto-criança/jovem etc. Boa leitura!

O Modelo Sudbury de Educação

Jeffery A. Collins (Hudson Valley Sudbury School)
Disponível em: http://sudburyschool.com/articles/sudbury-model-education
Tradução de Luís Gustavo Guadalupe Silveira

O Espectro da Responsabilidade

            A diferença fundamental entre uma escola Sudbury e qualquer outro tipo de escola é o nível de responsabilidade dos estudantes. Numa escola Sudbury, os estudantes são os únicos responsáveis por sua educação, seu aprendizado, sua avaliação e seu ambiente.
Numa escola pública, o Estado é responsável pela maioria dos aspectos da educação dos estudantes, incluindo o currículo e a avaliação. O estudante tem pouca responsabilidade e deve aprender o que é ensinado, do modo como é ensinado, no ambiente em que é ensinado e por fim deve repetir tudo na hora da avaliação.
            Numa escola particular tradicional, os administradores têm um papel maior na determinação do currículo, se comparados aos administradores da escola pública. Em algumas escolas particulares, a escola é responsável pela avaliação, enquanto em outras a escola aplica testes estaduais. Na maioria das escolas particulares, como nas públicas, o estudante é pessoalmente responsável somente por aprender o que outra pessoa determina que é importante aprender, no momento em que ela pensa ser importante aprender isso, de um jeito que outra pessoa determinou que isso deveria ser ensinado, num ambiente criado por outros, e os estudantes devem realizar isso tudo de forma suficientemente boa para passar nas avaliações elaboradas e pontuadas por outra pessoa.
            Num ambiente de homeschooling, os pais são os maiores responsáveis pela educação dos estudantes. Em Nova Iorque e em muitos outros Estados, contudo, o Estado ainda tem alguma responsabilidade na determinação do currículo dos homeschoolers e na sua avaliação. Eles devem realizar testes estaduais e os pais devem preencher e entregar relatórios de progresso para o distrito escolar local quatro vezes por ano. Como as escolas públicas e privadas, a responsabilidade não é do estudante.
            Essas opções educacionais descrevem uma gama de graus de responsabilidade. Esse espectro começa com o estudante e se estende para os pais, a escola, a comunidade, os Governos Estadual e Federal. Nós nos referimos a isso como o Espectro da Responsabilidade. Opções educacionais com um currículo compulsório (ou seja, a maioria das escolas públicas) tendem a ficar no final do espectro. Escolas particulares ocupam uma porção ampla do espectro, com a filosofia educacional específica da escola determinando exatamente onde ela fica no espectro. O homeschooling também ocupa uma porção ampla, e a filosofia educacional dos pais é que determina o nível de responsabilidade dos estudantes. Uma escola Sudbury é a única opção educacional em que toda a responsabilidade está com o estudante.

A Filosofia Sudbury

            Estudantes de uma escola Sudbury têm total controle sobre o que eles aprendem, como aprendem, seu ambiente educacional e como eles são avaliados. Eles escolhem seu currículo. Eles escolhem seu método de aprendizagem. Eles escolhem, por meio de um processo democrático, como seu ambiente funciona. Eles escolhem com quem irão interagir. Eles escolhem se, como e quando são avaliados – frequentemente eles escolhem avaliar a si mesmos. Isso é radicalmente diferente de qualquer outra forma de educação e é isso que diferencia uma escola Sudbury das demais.
            Por que uma escola Sudbury dá esse nível de responsabilidade ao estudante? Pois seus educadores acreditam que as crianças são capazes de assumir esse nível de responsabilidade. Não é um tipo de ferramenta pedagógica usada para motivar os estudantes. A responsabilidade é real; os estudantes têm realmente a última palavra sobre sua educação. Dar responsabilidade real para os estudantes lhes permite ganhar a experiência de tomar decisões e lidar com as consequências de suas escolhas. Desse modo, os estudantes ganham experiência e maturidade.
            Grande parte do esforço atual em educação é dedicada a tentar motivar os estudantes a aprender. Uma escola Sudbury não faz nada para motivar os estudantes; nós acreditamos que eles são inerentemente motivados. Nós acreditamos nisso porque todas as evidências do desenvolvimento infantil corroboram essa tese. Qualquer um que tenha observado um bebê tentando dar seus primeiros passos ou aprendendo a falar entende isso com clareza. O bebê se esforça e erra e continua a tentar e a errar até que finalmente – sozinho – pega o jeito e começa a andar e a falar. Se não for reprimida, essa motivação interna para crescer e se desenvolver não morre quando a criança chega à idade escolar.
            A motivação externa só é necessária quando outra pessoa determina o que o estudante deve aprender. Quando os estudantes determinam seu próprio currículo, a motivação externa não é necessária. Estudos têm mostrado que pessoas que determinam sozinhas o que vão aprender retêm significantemente melhor o assunto do que se outra pessoa determinasse por elas.[1]
            Parece ser consenso geral em nossa sociedade a ideia de que, se deixadas por conta própria, as crianças nunca aprenderão nada. Deve-se dizer a elas o que é importante aprender e quando devem aprender. Numa escola Sudbury, a equipe e os pais acreditam que os estudantes são os únicos que devem decidir o que é importante aprender. Eles são os responsáveis por eleger seus interesses e, afinal, seus objetivos na vida. Há inúmeros exemplos disso numa escola Sudbury. Um dos exemplos mais claros é o caso de uma menina que, segundo a visão da equipe da escola Sudbury, tinha um grande talento para escrever. Durante anos após a garota ter entrado na escola Sudbury, a equipe achava que deveria encorajá-la a se concentrar em suas habilidades de escritora. Ao invés disso, a garota passava seu tempo socializando com seus pares. Depois de alguns anos escrevendo muito pouco, quase nada, a garota voltou a escrever e sua habilidade havia dado um salto significativo em profundidade e em compreensão das emoções humanas. Ficou claro para a equipe que seus anos se socializando não foram “desperdiçados”. Eles foram gastos, consciente ou inconscientemente, aprendendo sobre pessoas. Quando a equipe refletiu sobre isso, percebeu que a garota havia passado seu tempo exatamente da maneira como ela precisava ter feito. Se a equipe tivesse forçado, ou mesmo encorajado sutilmente, a garota a passar o tempo escrevendo, ela provavelmente teria melhorado a mecânica de suas habilidades de escrita, mas teria perdido a profundidade e a sensibilidade que sua escrita desenvolveu graças à oportunidade que ela teve de se socializar e de compreender outras pessoas.
            Ninguém numa escola Sudbury vai dizer aos estudantes o que eles têm que aprender. Ninguém vai exercer nenhuma pressão num estudante para que ele aprenda algum assunto. Nem ao menos sugerir que seria uma boa ideia se um estudante aprendesse determinado assunto. Toda a responsabilidade é deixada para os estudantes; nós chamamos isso de Aprendizagem Iniciada pelo Estudante. Quando deixamos os estudantes decidir sozinhos o que fazer e o que aprender, eles passam muito tempo se socializando. Diferente de escolas com currículo compulsório, uma escola Sudbury acredita que o tempo gasto se socializando é inestimável para a educação e o crescimento dos estudantes.
            Uma das questões normalmente feitas a educadores Sudbury é: “O que acontece se uma criança não quer aprender a ler?” Nossa resposta é que isso simplesmente não acontece. É o mesmo que perguntar: “O que acontece se uma criança não quer aprender a falar?” Em nossa sociedade, ler é uma importante ferramenta de comunicação. As pessoas são inerentemente motivadas para expandir sua habilidade de se comunicar, e essa motivação interna resultará em crianças aprendendo a ler. Contudo, numa escola Sudbury, leitura raramente é “ensinada” da maneira como pensamos que ela é normalmente ensinada. Nenhum professor fica diante de crianças de 5 e 6 anos de idade e decompõe as palavras em elementos fonéticos. Ao invés disso, ler é parte da cultura – tanto quanto falar é parte da cultura. Estudantes aprendem a ler, e em grande medida ensinam a si próprios a ler, porque querem ser capazes de participar mais no mundo. A escola Sudbury original, a Sudbury Valley School, existe há 36 anos [ela foi fundada em 1968, este texto é de 2004]. Ao longo desse tempo, eles tiveram milhares de estudantes. Em toda a história da escola, nenhuma criança deixou de aprender a ler e nenhuma teve uma aula formal de leitura. Essa mesma experiência pode ser observada com respeito ao aprendizado de outras coisas “básicas”, tais como escrita e matemática. Os estudantes aprendem porque eles reconhecem que precisam aprender isso a fim de sobreviver e prosperar dentro de sua cultura.
            Escolas Sudbury não têm avaliações formais de seus estudantes. Não há notas nem provas. Acreditamos que a melhor pessoa para avaliar o progresso de um estudante é o próprio estudante. Ele sabe quando entendeu um assunto ou uma habilidade e quando não conseguiu fazê-lo. A experiência mostra que quando um estudante se autoavalia, ele aplica um critério muito mais rigoroso do que quando outra pessoa o avalia. Ele tende a medir a si mesmo em relação à perfeição – não em relação ao “bom o suficiente”. Ocasionalmente, um estudante pede por uma avaliação externa, seja por um membro da equipe ou por outro estudante. Quando ele faz isso, exige uma crítica honesta. O estudante não está interessado em ser enganado. Ele busca a perfeição e quer saber se conseguiu alcançá-la.
            Numa escola Sudbury, não há separação por idade. Todos os estudantes são livres para se misturar a outros estudantes de qualquer idade. Numa escola com um currículo compulsório, é necessário separar os estudantes por habilidade para que possam ser instruídos ao mesmo tempo – a maneira mais fácil de fazer isso é supor que as crianças com a mesma idade têm as mesmas habilidades e os mesmos interesses. Isso pode levar ao tédio por parte de alguns estudantes se o ritmo da instrução for muito lento, e alguns estudantes podem ficar estressados e ser eventualmente prejudicados se o ritmo da instrução for muito rápido. Numa escola Sudbury, os estudantes podem buscar sua educação em seu próprio ritmo, então não há nenhuma razão para separar os estudantes por idade.
            Escolas Sudbury acreditam que há uma grande vantagem em permitir que estudantes de idades diferentes[2] se misturem livremente. De fato, a mistura de idades tem sido chamada nas escolas Sudbury de “arma secreta”. Há vantagens emocionais, sociais e educacionais em permitir a mistura entre idades diferentes. Emocionalmente, estudantes mais velhos podem assumir o papel de irmãos ou irmãs mais velhos(as) para os estudantes mais jovens. Estes ganham segurança e conforto por meio dessa relação. A mistura de idades proporciona um ambiente seguro para os estudantes trabalharem suas habilidades sociais. Estudantes que não têm confiança nessas habilidades podem praticá-las e trabalhar para melhorá-las por meio da interação com outros estudantes, sejam eles mais velhos ou mais novos. Estudantes de todas as idades podem ver estudantes mais maduros ou membros da equipe como modelos de comportamento.
            Em Escolas Sudbury, é muito comum que estudantes aprendam com outros estudantes. Algumas vezes, o estudante que ensina é mais velho que o aprendiz, algumas vezes é o contrário ou eles têm a mesma idade. A única constante é que tanto o aprendiz quanto o mestre melhoram seu conhecimento sobre o assunto. Uma das melhores formas de melhorar o conhecimento sobre algo é ensiná-lo para alguém.
            Para que os estudantes sejam capazes de ser totalmente responsáveis por sua educação, eles devem ter – ou ao menos compartilhar – a responsabilidade de criar seu ambiente de aprendizagem. Isso significa que escolas Sudbury funcionam num regime de democracia participativa. Todos os estudantes e toda a equipe (conhecidos em conjunto como Assembleia Escolar) são parte da democracia e todos os estudantes têm voz nas discussões e voto nas decisões. Em outras palavras, um estudante de 5 anos de idade tem a mesma voz e o mesmo poder na escola que um membro da equipe. A equipe não tem poder de veto das decisões tomadas pela Assembleia Escolar. O único limite é que a Assembleia não pode fazer leis que violem as leis locais e estaduais e não pode fazer uma regra que coloque a comunidade escolar em risco.
            Por meio da participação no processo democrático da escola, os estudantes ganham experiência em trabalhar com outras pessoas para tomar decisões. Eles ganham experiência em defender suas posições sobre assuntos importantes que afetam sua vida diária. Eles compreendem que suas opiniões são importantes e que eles podem afetar a comunidade em geral.

O Funcionamento Diário de uma Escola Sudbury

            Escolas Sudbury funcionam de um modo muito diferente de outros tipos de escola. Para criar um ambiente em que estudantes são responsáveis por sua educação, a estrutura da escola tem que mudar. A diferença mais impressionante é que não há “salas de aula” e que não há “professores” – pelo menos no sentido tradicional dessas palavras. Estudantes são livres para determinar como passar o seu tempo a cada dia, eles não são limitados por uma sala de aula onde um adulto lhes diz o que devem aprender. Eles podem trabalhar num projeto de arte, praticar esportes, cozinhar, dançar, ler, conversar com outros estudantes ou com a equipe, construir um forte, observar pássaros, fazer um experimento científico, subir em árvores, escrever uma história, jogar um jogo de computador, ou trabalhar com um mentor de fora do câmpus. Quando os estudantes decidem que querem aprender algo novo, seja um assunto acadêmico ou não, eles podem tanto pedir ajuda para um membro da equipe quanto para outro estudante, ou simplesmente aprender sozinhos.
            Semanalmente há uma assembleia, a Assembleia Escolar, em que a maior parte das questões cotidianas a respeito do funcionamento da escola é discutida e votada. A Assembleia Escolar funciona como a Assembleia da Prefeitura de New England. A Assembleia Escolar é conduzida pelo(a) Presidente da Assembleia Escolar e as atas são feitas pelo(a) Secretário(a) da Assembleia Escolar. Na maior parte das vezes, o(a) Presidente e o(a) Secretário(a) são estudantes que foram eleitos por outros estudantes e pela equipe. Uma pauta é publicada antes da reunião e todos os estudantes e membros da equipe são bem-vindos para participar da Assembleia. As vozes de todos nas discussões e os votos de todos nas decisões têm o mesmo peso.
            A Assembleia Escolar é a autoridade final sobre todos os assuntos relativos ao funcionamento de uma Escola Sudbury e as únicas exceções são o orçamento anual, a escala de pagamento da equipe, requisitos para graduação e a política do Câmpus Aberto. Essas questões são de reponsabilidade da Assembleia Geral. Esta é composta de estudantes, seus pais ou responsáveis e pela equipe e também funciona no sistema de democracia participativa. A Assembleia Geral normalmente se reúne uma vez por ano para aprovar o orçamento do ano seguinte. Ela dá aos pais importante voz em relação às questões vitais da escola.
            Um dos aspectos mais importantes na condução de qualquer instituição é o cumprimento das regras institucionais. Numa escola Sudbury, a Assembleia Escolar é responsável por criar e fazer cumprir essas regras. Essa responsabilidade é frequentemente delegada a um grupo menor de estudantes e membros da equipe conhecido como Comitê Judicial ou CJ. Na maior parte das escolas Sudbury, o Comitê Judicial é composto por dois Oficiais do CJ, de 3 a 5 estudantes de diferentes faixas etárias e um membro da equipe. Os Oficiais do CJ são normalmente estudantes que foram eleitos pela Assembleia Escolar e servem por dois meses. Seu trabalho é garantir que o CJ funcione sem problemas. Os estudantes de diferentes faixas etárias servem num esquema de rodízio – parecido com o serviço de júri. A rotatividade do membro da equipe normalmente é diária.
            Quando um estudante ou um membro da equipe acredita que uma regra da escola foi quebrada, preenche um formulário de reclamação do CJ. A reclamação descreve o que aconteceu, onde e quando e aponta se há testemunhas. O CJ se encontra diariamente e analisa todas as reclamações. Para cada uma delas, O CJ investiga o incidente, escreve um relatório da investigação e determina se alguma regra da escola foi violada. Em caso afirmativo, ele apresenta uma queixa contra a pessoa (estudante ou equipe) que talvez tenha quebrado a regra. O acusado pode se declarar culpado ou inocente. Se ele se declarar culpado, o CJ determina a sentença apropriada para a violação. Se o acusado se declarar inocente, um julgamento é realizado. Assim como na Assembleia Escolar, cada membro do CJ tem igual direito a voz e voto.
            Uma das reponsabilidades mais importantes da Assembleia Escolar é escolher a equipe. Isso é feito anualmente por uma votação que decide quais membros da equipe atual serão recontratados para o ano seguinte. É uma ideia muito radical essa que permite que os estudantes ajudem a determinar a equipe da escola, mas que é necessária quando se dá a eles a responsabilidade real por sua educação. Não existe responsabilidade parcial. Ou os estudantes são responsáveis ou não são. Ou se confia neles ou não. Se os estudantes não fossem autorizados a participar na seleção dos membros da equipe, um dos aspectos mais importantes do ambiente e do funcionamento da escola seria tirado deles. A mensagem seria que a eles não é confiada a responsabilidade de tomar decisões realmente importantes.
            Se os membros da equipe não são responsáveis por direcionar a educação dos estudantes, então eles são responsáveis pelo quê? Qual é o papel da equipe? Numa escola Sudbury, os membros da equipe são responsáveis pelo funcionamento da escola. Se espera deles que sejam modelos de comportamento adulto responsável. Que ofereçam suas ideias e experiências nas discussões da Assembleia Escolar. Que estejam disponíveis para os estudantes quando eles pedirem ajuda e orientação. Acima de tudo, que ajudem a garantir o funcionamento e o sucesso da escola dando continuidade à comunidade e à cultura da escola.
            Um dos aspectos mais impressionantes de uma escola Sudbury é a relação entre a equipe e os estudantes. Os membros da equipe têm altas expectativas com relação aos estudantes. Esperam que eles sejam capazes de assumir responsabilidades. A equipe interage com os estudantes como se eles fossem adultos – talvez adultos jovens e inexperientes, mas não menos adultos. Ela ouve os estudantes.
            Ocasionalmente, os estudantes numa escola Sudbury decidirão que querem aprender um assunto ou que desejam perseguir uma carreira profissional ou acadêmica. Quando eles decidem isso, a equipe está lá para apoiar sua escolha e ajudá-los a alcançar seus objetivos. Isso pode ser feito pelo ensino efetivo de um assunto, pela recomendação de um livro ou outro material de referência, pela identificação de um recurso externo ou pela viabilização de um estágio. Um exemplo disso ocorreu em nossa escola, com uma estudante que queria claramente se tornar veterinária. Ela abordou a equipe e perguntou o que ela precisava fazer para entrar numa boa faculdade de veterinária. A equipe ajudou a estudante a realizar um programa de estudos de curta duração com um veterinário local. Durante o programa, a estudante visitou a clínica veterinária durante o horário de aula. Quando o programa terminou, o veterinário foi muito positivo sobre a experiência e falou que a estudante seria bem-vinda para voltar para um estágio quando ela atingisse a idade legal para isso. A chave disso tudo foi que a estudante sabia o que queria. A equipe estava lá para apoiá-la e encorajá-la em seu caminho, mas não para determinar o seu caminho.

Resultados de uma Educação Sudbury

            Em razão do Modelo de Educação Sudbury ser tão diferente de qualquer outra forma de educação, muitas pessoas se perguntam sobre os resultados de uma educação Sudbury. Especificamente, elas imaginam se os formandos serão capazes de entrar na universidade ou se serão capazes de lidar com o mundo “real”. Resumidamente, ao longo da história, os formandos têm se dado muito bem quando se trata de entrar na universidade. A Sudbury Valley School tem feito um estudo extensivo sobre seus ex-estudantes[3]. Os resultados de seus estudos mostram que uma grande maioria (87%) dos formandos continua em alguma forma de educação avançada: universidade regular, universidades comunitárias, escolas de artes, institutos de culinária etc.
            Diferente das escolas de Educação Compulsória, os formandos de uma escola Sudbury não entram numa universidade com base em seus históricos e suas atividades extracurriculares. Eles entram na universidade porque tendem a ser muito focados em sua escolha de carreira. Isso resulta em pedidos de admissão que se destacam da multidão. Estudantes Sudbury tiveram tempo durante seus anos de ensino médio para investigar diferentes opções e para descobrir suas paixões.
            Um dos fatos mais impressionantes descobertos no estudo da Sudbury Valley School a respeito de seus ex-estudantes foi que 42% dos que responderam à entrevista são ou autônomos ou empreendedores.[4] Isso é compreensível dada a filosofia educacional de uma escola Sudbury. Os estudantes foram capazes de desenvolver seus interesses e suas habilidades para assumir responsabilidades. Uma vez acostumados a ser responsáveis, é difícil abrir mão da responsabilidade em favor de outra pessoa.

Conclusão

            Uma das ideias equivocadas em relação às escolas Sudbury é que elas devem ser fáceis – afinal, os estudantes são livres para fazer o que quiserem sem um professor para dizer o que devem fazer. Nada pode estar mais distante da verdade. Uma escola Sudbury é difícil exatamente pelo mesmo motivo que leva as pessoas a pensar que ela é fácil. Sem ninguém dizendo aos estudantes o que fazer, eles não têm escolha a não ser decidir o que fazer por conta própria. Isso é muito mais difícil do que simplesmente seguir instruções.
            Uma vez que as pessoas tenham entendido a filosofia Sudbury, elas frequentemente perguntam “por que todo mundo não manda suas crianças para uma escola Sudbury?” Minha resposta é simplesmente porque muitos pais não acreditam ou confiam que seus filhos são motivados para aprender. Eu não sou capaz de contar quantas vezes um pai me falou: “Isso parece ótimo, mas minha criança iria brincar o dia todo e nunca aprenderia nada – ela precisa ser pressionada.” Para ser educado, eu não questiono essa crença. Em minha cabeça, contudo, minha resposta é: “Se sua criança não fosse motivada, ela ainda estaria deitada no berço, chorando por comida quando tivesse fome”. A criança teve motivação suficiente para aprender a andar, comer alimentos sólidos, falar e para desenvolver muitas, muitas outras habilidades. Seria realmente muito fácil para a criança simplesmente ficar deitada num berço e chorar por comida, mas ela escolheu o caminho mais difícil, o de um bebê que decide aprender a se tornar uma criança. Da mesma forma, as crianças irão escolher o caminho difícil e empoderador que leva da infância à idade adulta.



[1] Deci, E.L., & Ryan, R. M. (2002). The paradox of achievement: The harder you push, the worse it gets. In J. Aronson (Ed.)
[2] A Sudbury Valley School e outras escolas Sudbury trabalham com estudantes de 4 a 19 anos de idade [NT].
[3] Greenberg, D., & and Sadofsky, M. Legacy of Trust: Life After the Sudbury Valley School Experience (1992) (Sudbury Valley School Press; Framingham, MA) pp. 249.
[4] Idem.

4 comentários:

  1. Mais um reforço para a escolha que fiz: meu aprendizado livre.E vamos que vamos...

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  2. Luiz Gustavo,
    Sou estudante de arquitetura em Uberlândia, e como trabalho final de graduação de curso escolhi como tema uma instituição alternativa de ensino, fiquei muito interessada no blog e no projeto de vocês, seria de grande valia para meu projeto saber mais sobre o assunto. existe algum email em que passa entrar em contato com vocês?
    Obrigada

    Ana Flávia

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    1. Oi Ana Flávia! Será um prazer ajudar! Escreva para casadaarvorecdal@gmail.com

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  3. Que texto incrível!! Cada dia mais apaixonada pelo assunto!!

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