quinta-feira, 25 de setembro de 2014

Sobre a proibição do Parto Humanizado em Uberlândia

Era uma vez uma cidade de médio porte (700.000 habitantes), promissora e em franco desenvolvimento e crescimento... Era uma vez uma cidade do Triângulo Mineira famosa por seu moralismo e tradicionalismo do interior... Era uma vez uma terra fértil, gentil e próspera... Era uma vez Uberlândia e sua diversidade...
Nessa cidade, eu moro e me invento há 34 anos.  E nessas últimas semanas me vejo completamente absorvida por um redemoinho que passou por aqui e levantou poeira, fantasmas e uma triste realidade: nossos hospitais particulares (depois eu conto sobre o sistema público!) desconhecem o PARTO HUMANIZADO! E pior! Proíbem em suas dependências que as mulheres tenham esse direito de escolha garantido.
Dia 09 de setembro de 2014, o único hospital particular da cidade que aceitava que algumas médicas conscientes e envolvidas com seu trabalho pudessem realizar uma assistência obstétrica humanizada e em conformidade com todas as diretrizes e regulamentações dos Órgãos de Saúde de referência Nacional e Internacional (Organização Mundial de Saúde, Ministério da Saúde, Política Nacional de Humanização...) decidiu proibir o Parto Humanizado... assim, sem nenhum argumento coerente... meio que alegando o incômodo dos outros pacientes com os “gritos” das mulheres e a falta de estrutura adequada e ainda colocando no meio palavras sobre atos irregulares e ações judiciais contra o Hospital.



Mas ao fazer isso, ele relacionou de forma errada (e tenho certeza que proposital), essa irregularidades e até riscos de erros médicos e processos, com o parto humanizado. SACANAGEM! E ao fazer isso, ele nos dá o direito de resposta, porque as irregularidades do Hospital nada têm a ver com os partos e sim com cobrança indevida (e a parte) dos pacientes com convênio médico... tem uma baita ação na Justiça por causa disso e é muito feio omitir esses dados da conversa!!! Já que querem falar das irregularidades, que falem quais são!!! Ah!!! E sobre os riscos para os bebês e futuros processos, cabe DESTACAR QUE OS PROCESSOS QUE EXISTEM CONTRA O HOSPITAL RELACIONADOS A PARTOS SÃO TODOS DE CESÁREAS OU PARTOS NORMAIS CONVENCIONAIS (os quais eles querem manter!!!) e AINDA NÃO EXISTE NENHUM PROCESSO NA CIDADE CONTRA NENHUMA DAS MÉDICAS QUE REALIZAM ATUALMENTE O PARTO HUMANIZADO NA CIDADE. Então, senhores diretores do Hospital Madrecor, se querem evitar danos e riscos às mulheres e bebês, façam o favor de se atualizarem e buscarem informações respaldadas na Medicina Baseada em Evidências! Estudem! Conheçam primeiro o que é o parto humanizado, como é a assistência e quais são as porcentagens de “sucesso”, antes de divulgarem informações truncadas!
 (Aqui alguns artigos científicos e documentos sobre o assunto)

Sobre a falta de estrutura adequada para o parto humanizado... Isso aí até que eu concordo, porque realmente o Hospital e Maternidade Madrecor NÃO ESTÁ REGULAMENTADO PARA FUNCIONAR COMO MATERNIDADE!!! (Assim como nenhum outro hospital da cidade). E precisamos falar sobre isso.

Desde 2008, existe uma Resolução Nacional, a RDC-36, que dispõe sobre Regulamento Técnico para Funcionamento dos Serviços de Atenção Obstétrica e Neonatal, com a qual qualquer Hospital que pretenda oferecer assistência obstétrica deveria estar de acordo. E nela, o parto humanizado, a sala PPP (pre-parto, parto e pós parto), a presença do acompanhante de escolha da mulher, a assistência humanizada ao bebê e todo o resto que vocês estão querendo proibir, está contemplado... Vale dar uma lida toda semana, para ver se abre alguma possibilidade de diálogo e coerência no discurso! E a RDC-36, é só o começo! Hoje existem várias portarias e estratégias recomendadas pelo Ministério da Saúde que estão todas diretamente envolvidas com a Humanização do Parto e Nascimento e todas com respaldo científico garantindo que a assistência individualizada, a não intervenção instrumental ou medicamentosa sem necessidade, o respeito ao processo fisiológico, o ambiente acolhedor e a presença de pessoas de confiança da mulher e amorosas reduzem (E MUITO) o risco de complicações durante o nascimento.

Redução de mortes maternas e neo-natais, vocês adoram falar sobre isso e apesar do excesso de cesarianas, esses índices continuam altos!!! Proponho a gente conversar com estatística, senhores diretores das Maternidades de Uberlândia. Topam? Pegamos o número total de nascimentos, separamos os humanizados, das cesáreas eletivas e partos convencionais (adorei essa denominação, rs) e comparamos as porcentagens das complicações... Vamos ver quem ganha??? Não estou nem sugerindo uma pesquisa de satisfação das usuárias, mas se quiserem, tb podemos acrescentar. Lembrando que em nenhum momento eu disse que não existe risco no parto humanizado... é claro que existe e não o descartamos, lidamos com o evento de forma consciente, com todo suporte técnico e atenção que o mesmo requer, e talvez até por isso, o risco pode ser minimizado e identificado rapidamente... PARTO HUMANIZADO NÃO É PARTO DESASSISTIDO! NÃO É PARTO SEM EQUIPE DE SAÚDE! NÃO É PARTO SEM ESTRUTURA! NÃO É PARTO COM DOR!!! É um parto com muito acompanhamento e assistência, praticamente o tempo todo, mas que os recursos e intervenções só são utilizados se necessário, depois de avaliação individual e delicada do caso e com o consentimento das pessoas mais interessadas na saúde e bem estar do processo: a mulher, seu acompanhante e o bebê. E se for o caso de fazer algum procedimento (incluindo uma cesárea), que ele seja feito e será muito bem vindo... Temos histórias de partos humanizados com ocitocina, com centro cirúrgico, com analgesia, com episiotomia, com cesariana, com UTI neo-natal... sim, temos, e nos orgulhamos de contar que isso fez parte da história daquele nascimento e não dos protocolos genéricos do hospital. E temos mais uma porção de histórias de partos naturais, sem nenhuma intervenção e igualmente MARAVILHOSAS!!! Ai, como eu queria que vocês, senhores diretores, nos permitissem contar essas histórias, uma a uma... Ai, como eu queria que vocês sentissem na pele aquela onda de amor que preenche uma sala, uma casa, um hospital, o Universo, quando nasce um bebê de forma amorosa, respeitosa, acolhedora, HUMANIZADA...

E quando eu digo “senhores diretores”, incluo aqui todos diretores de Hospitais que ainda desconhecem o parto humanizado... e ainda, todos os gestores e todos os envolvidos com a saúde e que as vezes fazem comentários infundados e descabidos a esse novo paradigma da assistência ao parto e nascimento.

Mas preciso também agradecer, em nome de todo o Movimento em Prol da Regulamentação do Parto Humanizado em Uberlândia, que surgiu a partir desse acontecimento específico do Madrecor. Sim, as desgraças nos mobilizam a agir, a nos unir e a nos fortalecer. E foi isso que está acontecendo por aqui. Uma grande manifestação está acontecendo, nas redes sociais e fora dela, por causa disso. Muitas mulheres e homens revelando suas lindas e emocionantes histórias de partos humanizados e pedindo para que a gente possa continuar tendo essa possibilidade de escolha... Muitas barrigudas reivindicando seus direitos... Muitas profissionais engajadas e dando apoio e suporte técnico e científico ao Movimento... Nosso próximo passo é uma Manifestação Pacífica em frente ao Hospital no sábado, dia 27/09, às 16 horas... E semana que vem, uma Audiência na Promotoria com o Hospital em pauta... Quem quiser acompanhar e contribuir mais de parto, junte-se no face, por aqui.


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